Daredevilish Subtitling III – Especial Netflix

Intrépid@s leitor@s,

Hoje, fazemos uma pausa após quatro semanas seguidas comentando estreias. Ufa! Mas isso não é motivo para lamentações. Nesta quinta, essa janelinha dará espaço à terceira edição do “Daredevilish Subtitling”, nossa série de posts sobre ousadias em legendagem. Se você perdeu as duas primeiras edições, clique aqui.

Anteriormente, nos dedicamos basicamente a mostrar exemplos internos. Para democratizar a bagaça, hoje trazemos apenas exemplos encontrados externamente, mais especificamente na Netflix. A qualidade das legendas do Netflix é sempre tema de muita discussão na nossa área, mas principalmente junto aos assinantes da plataforma. Pasmem, chegou até no Reclame Aqui!

Se todos os espectadores fossem educados assim, eu até pensaria em ser legendadora.

O aprendiz de língua japonesa só se equivocou em um aspecto: qualidade de tradução não é um aspecto bobo. Não sabemos se as reclamações específicas dele procedem, porém sabemos que um punhado de gente em geral tem as mesmas queixas. Quem trabalha legendando para a Netflix há algum tempo sabe que as diretrizes mudaram de uns tempos para cá, e agora ela exige vários tipos de padronização que não existiam no início do serviço. Também foi lançada a plataforma Hermes para seleção de tradutores em resposta a uma suposta “dificuldade em arranjar legendadores” (os desempregado pira). Qualquer pessoa pode se candidatar através da plataforma para tentar a sorte, e o feedback geral é que a maioria das pessoas não é aprovada – a nota de corte é altíssima.

Notem que minha observação a seguir é baseada meramente em percepção, mas a qualidade da tradução das séries originais produzidas pela Netflix mais recentemente está melhor. Melhor não somente por não apresentar tantos erros básicos ou mais graves, mas a naturalidade dos diálogos me parece mantida com mais facilidade, com mais coloquialidade e maior fluidez gramatical. Isso sem contar as muitas ousadias que já testemunhei, causando reações que vão desde engasgar com o lanche da tarde até me pegar gargalhando alguns dias depois por causa de uma legenda.

Apesar de o ratinho estar todo saidinho na capa chamando as miga de loca, os exemplos de hoje são ousadias mais sutis, mas que deixaram a legenda tão luminosa que deu vontade de levantar para polir a tela. As ousadias tradutórias envolvendo assuntos relacionados a sexo e linguagem vulgar são as mais fáceis de encontrar (não que sejam de fato fáceis de encontrar) e abundaram nas duas primeiras edições. Então, hoje, fiquem com essas pequenas pérolas de inocência.

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Exemplo ousado #1

ODIOSO

O primeiro exemplo de hoje não é particularmente ousado tanto quanto é um excelente uso da língua portuguesa. A verdade é que o trecho todo que separamos aqui é um show de naturalidade em tradução de diálogos. Mas vamos ao vídeo:

Primeiramente, a fala “Why do you smell like Christmas?” foi traduzida como “Que cheiro de Natal é esse?”, uma adaptação não literal tão natural que passa pela fala de qualquer brasileiro. Depois, a expressão “feels right” foi traduzida como “tem a ver”, dando sequência impecável à naturalidade. E aí, para fechar numa reviravolta chocante, “I hate this day” foi traduzido como “Que dia odioso”. Esse adjetivo, “odioso”, é uma palavra que usamos pouco, causa estranhamento. Numa tradução em outro contexto, em que talvez o termo “hateful” fosse empregado, provavelmente o leitor já sentiria a necessidade de uma adaptação. No entanto aqui, onde nenhum adjetivo foi empregado em inglês, o tradutor optou por usar um em português e o jeito de falar ficou muito peculiar, meio engraçado. Soa como se alguém em português estivesse propositalmente empregando esse vocábulo meio incomum para chamar a atenção, não é? Mil pontos para esse tradutor que equilibrou todas as bolas no nariz e criou um trecho invejável!

 

Exemplo ousado #2

GOIABINHA

Essa série “Big Mouth” chegou roubando o meu coração, foi um binge-watching lascado. É o exemplo mais recente de todos, e me pareceu que a tradução da série toda tomou muita liberdade e foi uma experiência muito agradável ler as legendas. O trecho a seguir mandou ver na adaptação e, enfim, dispensa comentários!

 

Exemplo ousado #3

SEMANCOL

Todo mundo que assiste a “Stranger Things” se apaixona por aqueles meninos e o jeito deles de falar. Cada um com seu jeito peculiar, eles são juvenis e sofisticados ao mesmo tempo. Isso sem contar que trata-se da década de 80, com todas as suas características marcantes. Dá uma olhada no trecho abaixo:

O Semancol, esse remédio que a gente às vezes tem vontade de prescrever mesmo sem diploma de médico, foi uma solução genial e bastante ousada para adaptar “obliviousness”. Essa palavra difícil de sofisticada que o Dustin usou poderia ter encontrado uma tradução mais literal e perfeitamente adequada, mas o efeito não teria sido o mesmo, e nem a comicidade da fala teria permanecido a mesma. Mandar um semancol ali conjurou toda a aura que o momento pedia para o personagem: maturidade, superioridade e um certo quê de coisa antiquada.

E vocês, como teriam traduzido?

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Seguimos firmes recolhendo material para as próximas edições! Mandem seus próprios exemplos audazes ou de outrem para ola@www.littlebrownmouse.com.br/toca-do-mouse e nos ajudem a dar sequência na série 🙂

A LBM em cartaz: “Uma Razão Para Viver” e “Maria”

Car@s colegas,

Voltamos hoje com a programação normal de quinta-feira, depois do pequeno bug que nos fez perder a mão no calendário das últimas duas semanas! Procuramos da melhor forma nos redimir com um post no último domingo. Se você ainda não leu, clique aqui.

Anyways, vida que segue né, amoras? Esta semana, chegamos chegando com uma dobradinha nas estreias: um nacional e um internacional; um documentário e uma ficção; uma protagonista mulher e um protagonista homem. Affe, diz aí: é muita versatilidade, né não?

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Depois de um longo trajeto (o documentário concorreu no festival É Tudo Verdade, passou pelo Festival do Rio e pela Mostra de SP), o filme “Maria – Não se Esqueça que Eu Venho dos Trópicos” finalmente chega ao circuito cult nacional. A produção é uma visão geral sobre a carreira e vida pessoal da artista brasileira Maria Martins, pouco conhecida no próprio país, mas um expoente internacional no mundo das artes. Para simplificar, a mulher era um lacre sem fim. No começo do século passado, ela se divorciou de um homem poderoso, casou de novo, virou escultora, teve ateliê em NY, onde reunia a nata da arte mundial, tinha um casamento aberto e teve um romance com Marcel Duchamp, tendo sido uma grande influenciadora da arte dele (e não o contrário, valeu, críticos machistas do universo?). Assista ao trailer:

A obra de Maria Martins foi uma parte importante do nosso surrealismo, e se conectava com a sexualidade humana em vários níveis. Em sua crítica ao filme, Leonardo Ribeiro aponta: “Se valendo de um vasto acervo de imagens dos trabalhos, cartas, vídeos e fotografias particulares, o longa transmite com eficácia o olhar instigante e o desejo de subversão da protagonista, externado através da exploração do corpo humano (…).” Em tempos de reacionarismo quase medieval na nossa sociedade, em que a nudez e a relação orgânica com o corpo nu têm sido colocadas em foco como algo problemático, entrar em contato com a obra de Maria pode ser um sopro de ar fresco. Leia a crítica na íntegra aqui.

“O Impossível”. Qualquer associação a corpos nus e sexualidade NÃO É MERA COINCIDÊNCIA.

A produção é falada em português e inglês, e ganhou legendas by LBM nas duas línguas para ser exibido internacionalmente e agora por aqui, em salas selecionadas.

Hoje também, a Diamond Films traz para as telonas “Uma Razão Para Viver”. O drama no estilo cinematográfico britânico num estilo mais clássico foi dirigido por Andy Serkis, responsável pela caracterização de personagens épicos como a criatura Gollum (“O Senhor dos Anéis”) e o macaco César (“Planeta dos Macacos”). É no mínimo surpreendente que alguém associado a criações tão futuristas tenha dado início à sua carreira de diretor com um filme tão conservador, ainda retratando a trajetória de um homem que fica tetraplégico por causa da polio. Ou seja: zero movimento! 😨

O fato obviamente não passou despercebido por nenhum crítico. Dessa vez, no entanto, preferimos focar na reação do coração. Trouxemos para vocês o vídeo do canal The Reel Rejects, com o pessoal reagindo ao trailer em tempo real e fazendo comentários interessantes sobre Andrew Garfield! Sem spoilers, em inglês.

Aqui para os lados do ratinho, a novidade ficou por conta da assinatura: pela primeira vez, um colaborador nosso pôde assinar sua tradução junto ao crédito da LBM. A estreia da nova política nos deixa muito contentes e esperamos que traga satisfação e bons frutos para nossos colaboradores também! Para marcar a ocasião, convidamos a tradutora do filme, Samantha Silveira, para dividir conosco um pouco da experiência dela:

O filme tem um pano de fundo histórico, da época em que o Quênia era uma colônia britânica, mas o foco é a história pessoal do casal central. Apesar da gravidade da doença, os personagens são bem-humorados. Isso ajudou na tradução! Claro que, por ser um filme de época, foi preciso tomar cuidado com o registro, mas a linguagem dos diálogos era irreverente. A parte mais complicada foi a terminologia relativa ao cuidado médico, mas não era um jargão maçante que pesava no filme. Além disso, a fotografia é linda, e isso trazia leveza pra um tema tão complicado.

Parece que alguém gostou do filme!

Sempre bom renovar as esperanças com uma história de superação!

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Assim acaba mais uma edição do LBM em cartaz! Gostou ou amou? Deixe seus comentários e até semana que vem 😉

 

A LBM em cartaz: “A Noiva” e “Um Perfil Para Dois”

E, com vocês, ele. O único, incomparável e indispensável gerente de projetos da LBM: Johnny.

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Semana passada o ratinho não deu as caras aqui, mas como vocês já sabem, isso só acontece quando ele está muito atarefado, aka trabalhando pra caramba, e não sobra um tempo digno pro blog. Mas não tem problema, hoje a gente se redime! Vamos falar de “A Noiva”, esse terrorzão medonho que estreou semana passada, no Dia de Finados (Paris Filmes, we see what you did you there, OK?), e “Um Perfil para Dois”, o romance francês que tem um pé na comédia e outro no drama, a receita perfeita pra deixar qualquer trama bem interessante. Duvida? Vem comigo! Tá na hora de falar de dois trabalhos bem diferentes e que foram feitos em momentos beeeem diferentes também.

Vai com calma, J!

“Um Perfil Para Dois” é um filme muito agradável, com uma narrativa bem construída e uma boa pedida para os menos habituados com o cinema francês fugirem dos blockbusters americanos… por que, né? Nem tudo é filme de herói. Vale a pena “arriscar” ver algo diferente de vez em quando! Não vou me alongar na trama do filme, mas posso dizer que quem assistiu gostou  e recomenda. Leia aqui a crítica da Bianca Zasso para o Papo de Cinema para saber um pouco mais.

Por incrível que pareça, o ratinho já trabalhou em “Um Perfil Para Dois” há alguns meses, afinal a película fez parte da programação do Festival Varilux, que ocorreu de 7 a 21 de junho em diversas cidades do país. Perdeu esse festivalzão lindo? Não chora! Ano que vem tem mais! Fica ligado no site e ativa todas as notificações possíveis.

Quando foi a última vez que você viu um filme francês? Amelie Poulain não conta!

O ratinho fez barba, cabelo e bigode e cuidou tanto da legendagem quanto da acessibilidade de “Um Perfil Para Dois”, e duas coisas chamaram a atenção da nossa equipe dessa vez. A leitura de diálogos e a preparação para a interpretação de Libras. “Um Perfil…” não conta com cópias dubladas nos cinemas, isso significa que, para tornar o filme completamente acessível ao público com deficiência visual, gravamos além da audiodescrição, a leitura dos diálogos, ou seja, um profissional que não pode ser o mesmo audiodescritor do filme, lê os diálogos dos personagens ao longo do filme.

Não decepcione o Pierre e vá ver o filme nas telonas antes que ele saia de cartaz.

Muita gente pode achar estranho ter uma única voz responsável pelas falas de todos os personagens, mas acreditem, é questão de costume e, com uma boa mixagem, fica bacana. O que está se convencionando chamar de leitura de diálogos aqui, na verdade, nada mais é do que o bom e velho voice-over, que desde sempre é a modalidade de tradução preferida de alguns países do leste europeu como a Polônia. Confiram aqui a Julia Roberts e o Hugh Grant trocando uma ideia com a mesma voz. Depois de alguns minutos, já estou curtindo o filme. Sem entender lhufas, é claro! kk

Em seguida, partimos para a janela de Libras, que foi um desafio à parte. Nos dias que antecederam a gravação, eu e a Paloma Bueno, nossa incansável e dedicadíssima intérprete, seguimos o protocolo para esse tipo de filme: uma decupagem simples do roteiro, com todo tipo de anotação pertinente para a interpretação. Paloma dá a letra sobre o processo:

Num primeiro momento, durante o estudo da obra, trabalhamos com base no arquivo de legenda em português, claro! Nosso gerente Johnny estava presente, esclarecendo e dando dicas do francês que não tenho, contribuindo com a tradução para a Libras.

Os três principais desafios foram: primeiro, decidir as expressões equivalentes para a Libras, considerando que isso não é tão explícito nos falantes do francês; a expressividade não é entonada se comparada ao português. O segundo foi decidir quando e como fazer indicações da trilha sonora, que acabamos indicando como “música”, e sons ambiente como “som de sirene de ambulância”; esse último relevante para a compreensão do contexto [ação-reação] em cena. Já o terceiro e não menos importante foi diferenciar “voz em off” quando uma imagem aparece. Decidimos por redução articulatória, uma forma equivalente para fazer narração discreta sem aparição de falante.

Ufa! Não parou por aí… na decupagem, identificados os personagens, partimos para a criação dos sinais com base na característica física mais marcante e permanente no decorrer do filme. Por fim, tivemos a alegria de compartilhar esse processo na XXXVI Semana do Tradutor/II Simpósio Internacional de Tradução e II Encontro do Setembro Azul em Campos do Jordão – Surdez e Acessibilidade.

Nem tudo é romance no Rio Sena e aventuras em Libras na vida do ratinho! Às vezes, ele se mete numa história de amor pra lá de macabra nos recônditos sombrios da Rússia. Em “A Noiva”, um fotógrafo descobre uma forma de perpetuar a presença de sua falecida esposa ao seu lado. (Terapia pra quê, migo?) Só que coisa boa não podia sair dessa situação, convenhamos. Mas meus posts são spoiler free, então paro por aqui.

A grande curiosidade de “A Noiva” ficou por conta de o filme, uma produção original russa, ter sido lançado no Brasil com o áudio dublado em inglês, o que fez muita gente torcer o nariz  e se perguntar: “Por que não deixar o áudio original?”. Além disso, optamos por manter os nomes dos personagens como no original, sem adaptações, da mesma forma que a dublagem americana fez. Tal adaptação seria motivada, principalmente, pelo nome do casal protagonista: Ele = Vanya e Ela = Nastya, o que poderia causar uma confusão para o espectador, mas resolvemos honrar a tradição de Tchekhov e esperamos que ele esteja orgulhoso da gente.

Calma, ninguém tá tentando matar a noiva, não. Ela já está morta!

Tem um comentário bacana? Uma curiosidade? Fala com o ratinho nos comentários ou no Facebook.. Ele adora trocar ideia. Até a próxima!

A LBM em cartaz: “Mark Felt”

Car@s coleg@s,

Para a estreia desta quinta nublada, trouxemos nosso espião gerente João Artur de volta. Ele veio comentar “Mark Felt – O Homem que Derrubou a Casa Branca”, coisa sigilosa e ultrassecreta!

Se não quiser virar cúmplice, não leia!

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No atual cenário político do Brasil, a história de Mark Felt ganha contornos bem especiais. Afinal, um agente do FBI que provoca a renúncia (ou era isso ou era o impeachment) de um presidente (Nixon) após um escândalo de espionagem eleitoral poderia levantar vários pontos em comum com situações recentes na memória do povo brasileiro e cujos desdobramentos ainda estamos vivendo.

Nós também!

Em “Mark Felt – O Homem que Derrubou a Casa Branca”, Liam Neeson (“A Lista de Schindler”, “Busca Implacável”, “Silêncio”) dá vida ao agente do FBI que, secretamente, vazou informações para a imprensa americana sobre a invasão da sede do partido democrata no edifício Watergate, que virou sinônimo de escândalo. É sério! A língua inglesa e sua maravilhosa plasticidade logo adotou “-gate” como sufixo que indica escândalo. Divirta-se com essa incrível lista de escândalos com o sufixo “-gate”.

O atuação de Neeson dispensa comentários e mostra uma faceta humana do agente do FBI que é frequentemente reduzido aos feitos entregues por sua infame alcunha, “Garganta Profunda” – analogia que foi fruto do sucesso do filme pornográfico de mesmo nome naquele ano de 1972.

MOMENTO CURIOSIDADE!

“Lovelace”, a cinebiografia de Linda Boreman, a estrela de “Garganta Profunda”, foi traduzida pelo sócio-pai nos idos de 2013. No filme, Linda é interpretada por Amanda Seyfried.

O assunto segue polêmico, Seyfried.

Para quem quer fazer o dever de casa completo sobre o Escândalo de Watergate no cinema, o ratinho recomenda “Todos os Homens do Presidente” (1976), filme que venceu 4 estatuetas do Oscar e conta com atuações brilhantes de Dustin Hoffman e Robert Redford. A perspectiva narrativa desta vez é a dos jornalistas do Washington Post que colaboraram com Felt no vazamento de informações sobre as investigações de Nixon e seus aliados. Emocionante? Pode apostar!

Para não dizer que não falamos de tradução… além da dificuldade inerente a um filme recheado de termos políticos próprios de um sistema bem diferente do nosso, que precisam ser traduzidos ou adaptados e exigem muita pesquisa, vale destacar a atmosfera de suspense que envolve vários momentos do filme. Em diversas cenas, Felt encara seus próprios colegas e subordinados no FBI que nem suspeitam de sua atividade e todo cuidado é pouco na escolha do vocabulário para não escorregar e soltar informações antes da hora. Afinal quem sabe o quê? Desde quando? Enfim, todos esses detalhes devem ser levados em conta na hora de traduzir as falas de um homem que detém informações que podem derrubar a Casa Branca.

Espera… esse é outro filme!

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Obrigada Johnny! Voltamos semana que vem com mais uma estreia 🙂

Cinema de rua: histórias além do roteiro

Para esta semana, mais um post superespecial da nossa expert em rolês urbanos, Vanessa Bocchi. Desta vez, ela nos apresenta um panorama dos cinemas de rua em São Paulo, nos dando ótimos motivos para visitar esses espaços que tanto dizem sobre nossa cidade e cultura, mas que comumente não frequentamos. A Mostra de Cinema de São Paulo começa hoje, espalhada por diversos cinemas de rua de São Paulo, então fica a dica 🙂

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Noitão do Belas Artes. Quem nunca?
Crédito da imagem: Letícia Godoy

Semana passada, andava pela Rua Fradique Coutinho, em Pinheiros, onde moro há pouco mais de dois anos. Passei em frente ao Cinesala, cinema de rua tradicionalíssimo paulistano (se encontra no mesmo local desde 1962, com diferentes nomes ao longo dos anos). Sem compromissos agendados para a tarde, cogitei conferir a próxima sessão disponível, quando me dei conta que, naqueles últimos dois anos, havia ido ao Cinesala duas únicas vezes. Número baixíssimo para uma pessoa que se considera cinéfila e mora a um quarteirão do cinema, certo?

Depois de alguns bons minutos assimilando esse fato, comecei a tentar listar os motivos para que essa frequência fosse tão baixa. Seria por achar muito caro? Ou o comodismo de ter o combo sofá + TV me aguardando em casa do outro lado da Teodoro Sampaio era tentador demais para resistir?

Assumi para mim mesma que ambos os motivos eram verdadeiros (e não me orgulho de como o segundo me faz parecer preguiçosa, juro).

Com isso em mente, dediquei um tempo a pesquisar e escrever sobre cinemas de rua, mas não queria elaborar um ranking dos melhores e mais bonitos de São Paulo, como vejo constantemente pela internet. Queria engatar uma discussão sobre a importância de frequentá-los e percebendo ao mesmo tempo o papel deles na cidade, tanto na questão cultural quanto urbana.

Os cinemas de rua eram muito comuns na década de 60 e 70, mas ao longo dos anos que trouxeram exponenciais avanços tecnológicos, as redes de exibição preferiram investir em complexos com um grande número de salas dentro de shopping centers, aliando o cinema à sua área de lazer. Hoje são poucos os cinemas propriamente de rua espalhados pela cidade.

Abaixo, procurei listar os principais motivos para incluirmos esses incríveis espaços culturais e de entretenimento no nosso próximo roteiro de lazer.

 

Seleção dos Filmes

Chaplin aprova este cinema.
Crédito da imagem: Divulgação

O primeiro pensamento que vem à mente quando falamos de cinema de rua é a escolha da programação. Expressões como “filmes cult” ou “filmes cabeça” sempre aparecem no assunto e, se às vezes esses podem não ser os termos mais apropriados, não podemos negar que a maior parte do circuito de exibição dessas salas escolhem filmes que vão na contramão dos blockbusters, preferindo exibir filmes independentes, de pequenas distribuidoras, ou até mesmo realizando pequenas mostras de filmes clássicos e participando de festivais cinematográficos.

 

Ambientação

Um elemento diferencial desses empreendimentos são os espaços onde estão construídos, seu design arquitetônico e decoração. Não há comparação entre qualquer sala de um grande complexo de shopping com o Cine Marabá, por exemplo. Inaugurado em 1944 e tombado como patrimônio histórico, seu grande salão de entrada, lustres e fachadas passaram por uma restauração em 2009 e hoje o cinema abriga cinco salas de exibição.

Também vale conferir o Cinearte no Conjunto Nacional e sua aparência que remete a um grande teatro, além de outras salas cuja decoração é uma atração à parte. É o caso da Cinesala, com pôsteres de filmes clássicos espalhados pelas paredes (desde Monty Python até Trainspotting) e mobiliário de Ruy Ohtake e Zanine Caldas.

Ache o Wes Anderson na parede.
Crédito da imagem: Divulgação

 

História e Urbanismo

Se traçarmos uma rota pela cidade abrangendo a localização desses cinemas, temos mais do que um circuito de passeio, temos também um trajeto que conta a história da cidade. A localização do próprio Cine Marabá, na Av. Ipiranga, já diz muito sobre o cenário cinematográfico da época. Pertencente ao empresário paulista Paulo Sá Pinto, ele foi construído em frente ao antigo Cine Ipiranga, que pertencia ao espanhol Francisco Serrador, dono na época de um grande número de complexos na cidade. A escolha do local foi uma clara mensagem de oposição à hegemonia de Serrador nos cinemas paulistanos.

73 anos e contando.
Crédito da imagem: Divulgação

A Cinemateca Brasileira já teve suas projeções e eventos organizados no antigo Cine Fiametta (hoje o Cinesala!) até que, em 1992, a prefeitura cedeu o complexo tombado do Matadouro Municipal para abrigar sua vasta coleção de filmes. Ao longo dos anos, o espaço passou por diversas reformas e hoje nele também se encontra a Biblioteca Paulo Emilio Salles Gomes, que conta em seu acervo com quase 5.000 livros, revistas brasileiras e estrangeiras, estudos acadêmicos e diversos cartazes de filmes para fazerem a alegria de qualquer cinéfilo.

 

Matadouro? Que matadouro?
Crédito da imagem: Dario de Freitas

Infelizmente, quando falamos hoje do impacto desses cinemas nas metrópoles, o assunto é sempre acompanhado por um tom pessimista e nostálgico, já que a desativação da grande parte deles ao longos dos anos em todo o Brasil deixa um buraco na memória urbana e arquitetônica das cidades, alterando paisagens e a identificação dos polos culturais nos bairros.

Porém, para olhares mais otimistas, como o de Márcia Bessa e Wilson Oliveira Filho no excelente artigo “Nas ruas dos cinemas, cinemas nas ruas, cinemas de rua: a cidade como uma questão cinematográfica”, isso também significa que os espaços que ainda permanecem são um lembrete diário de sobrevivência e de revitalização de nossas áreas urbanas.

 

Manutenção

Falar sobre a importância histórica e de como a ambientação de um cinema de rua é muito mais agradável do que um shopping center é mais do que válido. Agora, quando olhamos para dentro da indústria das salas de exibições e entendemos como os pequenos espaços passam por ainda mais obstáculos para se manterem ativos, os motivos para os apoiar ficam ainda mais escancarados e deveriam influenciar na hora de escolher onde assistir ao próximo filme.

Por seu número reduzido de salas e seleção dos filmes exibidos (já discutido anteriormente), o lucro dificilmente é proveniente do faturamento da bilheteria. No modelo de negócio atual, as distribuidoras ficam com a maior parte do dinheiro arrecadado pelos filmes. Segundo o Sebrae, a lucratividade está baseada nos serviços complementares, como alimentos e bebidas, venda de espaço de mídia, aluguel da sala para eventos, etc. Tudo isso tem que acomodar os gastos elevados desse tipo de entretenimento, considerando equipamentos, estrutura e manutenção das salas.

Tudo isso complica ainda mais quando pensamos na concorrência. No mercado de exibidoras, os complexos com mais de 5 salas representam hoje quase 70% do faturamento desse mercado (Ancine, 2015).

 

Para os créditos finais…

Cada tópico abordado poderia se estender muito mais (há ótimos livros sobre o assunto, a história dos cinemas de rua cariocas, por exemplo, é riquíssima e recomendo muito o estudo), mas a mensagem que deixo é que há motivos para incluir esses cinemas no seu próximo passeio, que se torna ainda mais rico quando valorizamos a história e o cuidado que foi investido ali.  

Infelizmente, a oferta atual dos cinemas de rua não atende aos bairros mais periféricos (e isso já renderia um outro post). Por outro lado, a maioria desses cinemas possui fácil acesso através de transporte público. Tentem marcar já na agenda uma visita a um deles o mais rápido possível e passem pela experiência de irem ao cinema para curtir e absorver muito além do filme.

Referências

Márcia Bessa e Wilson Oliveira Filho, « Nas ruas dos cinemas, cinemas nas ruas, cinemas de rua: a cidade como uma questão cinematográfica », Ponto Urbe [Online], 15 | 2014, posto online no dia 30 Dezembro 2014, consultado 13 Agosto 2017. URL : http://pontourbe.revues.org/2536 ; DOI : 10.4000/pontourbe.2536

Paulo Roberto Elias, « Cinemas de rua » consultado 13 Agosto 2017. URL : http://webinsider.com.br/2013/01/03/cinemas-de-rua/

Arte das fotos: Ivan M. Franco

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Vanessa Bocchi é formada em Rádio e Televisão pela Faculdade Cásper Líbero, onde desenvolveu e praticou sua paixão pelo Cinema através da escrita de roteiros e produção de curtas-metragens. Hoje atua como publicitária, adora um bom café coado na Hario e divide seu tempo de lazer entre o eixo Pinheiros (SP) – Ipanema (RJ).