Este é o blog da Little Brown Mouse, a LBM, empresa familiar de preparação de legendas para cinema, composta por Claudio Fragano e Ligia Sobral Fragano.
Autor: Ligia Sobral Fragano
Tradutora e revisora de legendas para cinema há mais de 15 anos. Leitora de livros e todo tipo de porcaria da internet, mas sobretudo de legendas. Viajante (em todos os sentidos). Gestora de TAV e pós-produção. Sócia-fundadora da LBM, seu projeto de vida, com o maior orgulho do mundo.
Em tempos de coronavírus, trabalhar de casa surgiu como uma solução para muitos.
Aqui na LBM, mais de 60% da nossa equipe já trabalha remotamente há alguns anos. Nossas comunicações diárias, entre reuniões e discussões de projetos, incluem notas anedotais sobre o que nossos bichinhos de estimação andam aprontando enquanto tentamos nos concentrar no trabalho.
No post de hoje, nossa tradutora e coordenadora de projetos Paula Barreto descreve com detalhes como é a rotina trabalhando com três gatinhas em casa. Façam suas apostas: os bichanos mais ajudam ou atrapalham?
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Você acorda com os miados incessantes e cheios de drama abafados pela porta fechada do quarto. Pela força e intensidade dos miados, você sabe que as gatas estão clamando por comida – como se não comessem há três dias, e não há apenas algumas horas. Você pensa que, bem, elas têm que trabalhar essa ansiedade delas.
Você segue com seu ritual matinal de escovar os dentes, lavar o rosto etc, até estar pronta para receber uma enxurrada de pelos na cara. Não dá outra: é só abrir a porta que as três entram disparadas no quarto, feito foguete, e sobem na cama. Dali, ficam te olhando e miando, como se dissessem: “Qual é, ser humano? Cadê o rango? Quer matar a gente de fome?” Porque sim, gatos são muito dramáticos. Se houvesse um prêmio no reino animal para o bicho mais dramático, os gatos levariam essa mole, mole.
Bom, você sai do quarto, e no caminho até a cozinha, onde ficam os famigerados potinhos de ração, você mal consegue andar – são três gatas desesperadas por comida se embolando no meio das suas pernas. Cada passo precisa ser minimamente calculado para que não se pise num rabinho e – terror dos terrores – se ouça um miadinho de dor. Quem não tem bichinho jamais saberá a dor que é pisar sem querer nele! Você se sente o pior ser humano da Terra, um Hitler reencarnado, o próprio Pennywise em forma humana.
Quando sua missão de colocar ração fresquinha no potinho é bem-sucedida, você finalmente pode começar seu dia de trabalho. Trabalhar de casa com gatos é assim: você trabalha 20 minutos, para para deitar um pouco com a gatinha; trabalha mais 30 minutos, vai fazer um carinho na gatinha deitada no tapete (no sofá não pode!)… Trabalha, faz carinho, trabalha mais um pouco, faz carinho. Às vezes, se a gatinha é grudadinha com você, ela deita perto do seu laptop para te fazer companhia. Bem, isso se você for sortudo, porque se não for, a gata vai deitar… bem, em cima do laptop ou então em cima do mouse. E você que lute para digitar, usar o mouse e enxergar a tela sem incomodar o pobre do bichinho que tem uma vida muito dura de tirar vários cochilos por dia. Mas não tem sensação tão boa quanto trabalhar olhando para a sua gatinha enroladinha feito rocambole perto de você, dormindo feito um anjinho (quando acorda tá mais para anjo caído, tipo Lúcifer mesmo). Como mães de recém-nascidos, você aprecia profundamente toda aquela calma e tranquilidade, porque sabe que vai durar pouco, e quando o bicho acordar…Caos! Destruição! Apocalipse!
Eis que chega sua hora de almoço. Cada gatinha está em um cômodo diferente da casa, mas é só sentir o cheirinho da comida que as três vêm correndo e se postam diante de você, fazendo a maior carinha de gatinho do Shrek e passando toda inocência do mundo com o olhar. “Mas eu já como tão pouquinho no almoço…”, você pensa. Problema é seu! Não tem como ignorar os olhares pidões e os beicinhos sendo lambidos. Você se sente moralmente obrigada a dar um pedacinho do seu frango para cada uma das gatinhas. E pronto, agora é só terminar o almoço encarando diretamente a parede, sem olhar para baixo, sem fazer contato visual. E quando a sobremesa é iogurte? As gatas ficam loucas, ensandecidas. Chegam a cair na porrada por uma mísera gotinha de iogurte grego. Quando você larga o potinho vazio para elas lamberem, é praticamente uma luta de UFC entre as três.
Passado o almoço, você volta a trabalhar e tudo se repete. Às vezes as gatas estão correndo para lá e para cá feito loucas e você fica só ouvindo o barulho e se encolhendo, torcendo para não quebrarem nada (o que nem sempre funciona.). Às vezes elas pulam no seu colo e ficam ali deitadinhas no quentinho da sua coxa enquanto você trabalha, e esses momentos são como estar no paraíso (brega, eu sei, mas totalmente verdadeiro.). Às vezes, quando o dia está muito cheio e cansativo, você para por cinco minutos e deita na cama com as três, se tiver sorte de elas estarem coexistindo em paz por alguns minutos. E sempre com a certeza de que trabalhar de casa seria muito mais solitário sem suas fiéis companheiras.
Fazer home office é muito bom, mas como tudo na vida, também tem suas desvantagens. Você se sente sozinho, sem ter com quem conversar, sem ver o rosto de outra pessoa, sem interagir pessoalmente com ninguém. Tem dias em que você arruma qualquer desculpa para ir na rua e trocar um mísero “boa tarde” com quem quer que seja. Não é fácil, mas ter esses bichinhos ao seu lado torna tudo muito mais fácil e divertido. Ter três seres puros e inocentes (menos o tal anjo caído que já mencionei acima) a quem dar um pouco de amor, atenção e carinho sem dúvida é a melhor parte de trabalhar de casa – e você não trocaria isso por nada no mundo.
*** Pra quem quiser acompanhar as aventuras das gatinhas da Paula durante as horas vagas, sigam @mybooksandcats no Insta!
Retomo as postagens da nossa Toca hoje com uma mistura do Brasil com o Egito de temas apaixonantes: cinema, premiações e, por que não, legendas. Quem está ligado no mundo da sétima arte sabe que “Parasita” papou o Oscar de melhor filme na cerimônia da Academia este ano, sendo o primeiro filme estrangeiro e falado em língua estrangeira a ter essa honra na história da premiação. Isso sem contar todos os outros prêmios conquistados no último domingo: Melhor Diretor para Bong Joon-ho, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Roteiro Original.
Essa proeza já está rendendo muitas discussões sobre como o cinema será mudado para sempre e as novas possibilidades que se abrem para obras legendadas do mundo todo. Muito tem se falado também da admirável política implantada pela Coreia do Sul para exportar sua cultura e se tornar relevante em diversas áreas artísticas, tornando a economia criativa sua principal economia. O planejamento e execução dessa política admira porém não surpreende, especialmente se lembrarmos que a Coreia tem o alfabeto mais lógico e democrático dentre todas as línguas escritas, o Hangul. Ele foi criado no século 15 pelo Rei Sejong, o Grande (que homem!) como uma alternativa ao uso do chinês no país, tida como uma língua de elite e de difícil acesso para o povo. Vemos a importância que a língua, o mais importante elemento da cultura humana, tem na retomada social de um país. Mais ainda: para ser exportada com sucesso, uma cultura deve ser levada a sério (e consumida) internamente.
Ainda assim, sabemos a resistência que muitas culturas (hello, America!) têm em assistir a filmes legendados, abrindo mão de uma grande quantidade de obras incríveis. Do outro lado desse espectro, nos perguntamos se, com toda a expansão do audiovisual que testemunhamos nos últimos anos, a tradução de obras audiovisuais é criteriosa o suficiente para transportar culturas de forma eficiente. Como colocado por Kim em entrevista para The Korea Herald, “não é o trabalho dos legendadores traduzir literalmente ou apenas transcrever as falas, mas sim identificar a mensagem que o diretor quer passar e ‘construir a linguagem’ para que os espectadores estrangeiros cheguem ao cerne da mensagem”. Ele continua: “É um ofício difícil, que requer conhecimento profissional tanto em cinematografia quanto em proficiência linguística” (leia a matéria completa em inglês aqui).
Kim diz ainda que, apesar de legendas serem “o início e a essência” do consumo dos filmes por públicos não-coreanos, ainda não há um padrão bem estabelecido para a execução desse trabalho. Com base na nossa experiência de décadas de tradução para cinema aqui na LBM, foram pouquíssimas as vezes em que filmes internacionais chegaram até nós com orientações de tradução, em especial ditados pelo diretor ou diretora da obra. Uma das exceções é o diretor Steven Soderbergh, que sempre envia considerações sobre traduções-chave de seus filmes e tem uma equipe dedicada a revisar as versões em todas as línguas. Há alguns anos, tivemos um acontecimento inusitado envolvendo a tradução de “Logan Lucky – Roubo em Família” – clique aqui para ler a matéria que escrevemos na época contando tudo!
Desde sua criação em 2014, o blog da LBM tem como seu
principal objetivo trazer informações e discussões relevantes para nosso ofício
de tradução audiovisual. Esses insights vêm do nosso dia a dia, de uma equipe que
conta com pessoas de formações diversas, das Letras e Tradução ao Cinema. A
discussão das obras que chegam até nós é uma parte vital e indispensável do
trabalho que desenvolvemos em legendagem, acessibilidade e pós-produção.
Revisitando quase 6 anos de conteúdo, separamos abaixo alguns links para artigos escritos exclusivamente para ajudar tradutores, legendadores e intérpretes a ir mais a fundo no mundo da cinematografia e aprimorar seu trabalho com essa linguagem. Não deixe de nos contar o que vocês acharam!
Hoje é dia de estreia nos cinemas – segurem suas carteiras!
Para comemorar a estreia desse filmão encabeçado por ninguém menos que uma das mulheres mais poderosas do show biz na atualidade, Jennifer Lopez, trazemos uma tradução super especial. Nossa colaboradora Paula Barreto, em parceria com João Artur, preparou uma versão em português da crítica da revista Variety para o filme, publicada na ocasião da sua estreia oficial no Festival de Toronto, em setembro deste ano (saiba mais sobre a nossa equipe).
Que comece o golpe!
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Resenha do Festival de Toronto: “As Golpistas”.
Levando seu sex appeal a um nível impressionante, Jennifer Lopez interpreta uma dançarina empreendedora com um esquema para ficar rica no filme de Lorene Scafaria baseado num crime real.
A
sexualidade é uma arma que empodera as mulheres em “As Golpistas”, uma saga
sedutora que retrata um crime real e é para uma gangue de bad girls de Nova York o que “Os Bons Companheiros” foi para a
máfia – ou seja, mistura glamour e sex
appeal regado a champanhe com a loucura de um grupo de dançarinas que reduziu
a fortuna de vários endinheirados de Wall Street. Extravagante, erótico e
impossível de ser ignorado, “As Golpistas” representa nada menos que um momento
cultural, inspirado por um artigo escandaloso da “New York Magazine” (que
sustenta firmemente o filme em saltos agulha de 15cm).O artigo adaptado pela
roteirista e diretora Lorene Scafaria, que bebeu da fonte de Scorsese, é estrelado por uma Jennifer Lopez
como você nunca viu.
“Este
país inteiro é uma boate de striptease. Tem
quem jogue dinheiro e tem quem dance,” diz Ramona, a personagem de Jennifer Lopez,
a Julia Stiles (toda profissional, ao estilo “A Identidade Bourne”). Stiles interpreta
Jessica Pressler, que, sem julgamentos, investiga o caso. Praticamente todas em
“As Golpistas” interpretam uma versão de uma pessoa real, embora Julia Stiles
seja a única que ao ser escalada não precisou de uma mudança de visual milionária.
Entre as atrizes que entram na dança, estão a estrela de “Podres de Rico”
Constance Wu e a atriz de “Riverdale” Lili Reinhardt, além de participações
coadjuvantes de Keke Palmer, Cardi B e Lizzo – que juntas valorizam uma
profissão antes vista como imoral.
No
aniversário de 25 anos do lançamento de “Showgirls”, uma profissão que já foi
considerada degradante tem sido quase completamente repensada devido à terceira
onda feminista – que tem Madonna (uma óbvia inspiração para a
carreira de Jennifer Lopez) como símbolo, uma dominatrix da cultura pop que fez
do sexo sua marca e da lingerie sua
armadura no palco. Em vez de rejeitar
tudo que parece misógino e corrupto na sociedade, a geração X procurou
subverter as instituições por dentro.
De
repente, aulas de pole dance passaram
a ser oferecidas em vários estúdios dos Estados Unidos e garotas festeiras e
estrelas pornô passaram a ser tratadas como celebridades. Diablo Cody, uma
jovem escritora brilhante que fez sua fama escrevendo na internet sob a alcunha
de candy girl, ganhou um Oscar por
escrever uma comédia agradável a favor do aborto. E strippers de Nova York – que enganaram, drogaram e roubaram dos
ricos para dar a suas relativamente pobres carteiras – foram consideradas
heroínas desafiadoras no que a imprensa chamou de “uma história moderna de
Robin Hood”.
Ao
transpor o artigo de Pressler para sua visão cinematográfica, Scafaria levanta
questionamentos sobre representação logo de cara: que tipo de preconceitos as
pessoas têm quando pensam em strippers?
“As Golpistas” humaniza as mulheres que são o centro do enredo, dando a elas
namorados, histórias de vida e, mais importante, autonomia. As dançarinas são
espertas o bastante para incorporar qualquer fantasia masculina, mas fazem isso
do seu próprio jeito, e Scafaria nunca se esquece do fato de que são elas que
estão no comando o tempo todo: “Enrole na r*** do cara”, Ramona aconselha a
ingênua Destiny (Wu), explicando de modo grosseiro porém chiclete que strippers ganham dinheiro para provocar,
e não para realizar os desejos de seus clientes.
Samantha Foxx (nome verdadeiro: Barbash), a Ramona da vida real, já estava na casa dos 30 quando conheceu Roselyn Keo (que inspirou a personagem Destiny). A multitalentosa Jennifer Lopez, que sempre foi a personalidade mais elétrica em todos os filmes que já fez, tem uma diferença de idade de mais de uma década para a personagem que interpreta , mas ainda assim a estrela – que teve seu início de carreira dançando na série “In Living Color” – surpreende, mostrando movimentos de dança dignos de uma medalha olímpica em sua primeira cena. Destiny fica hipnotizada (e nós também) ao ver Ramona botar o Cirque Du Soleil no chinelo, girando e deslumbrando no palco como se fosse uma esplêndida sereia “rodopiante”, antes de deslizar até o chão e abrir espacates que fazem suas sandálias estalarem no piso.
Foi
isso que o malsucedido diretor Steve Antin tentou fazer com a vergonha que foi
“Burlesque”. “As Golpistas” é uma exaltação acrobática da feminilidade
desmedida, na qual moças “saidinhas” deitam e rolam com o poder que têm sobre
os homens – que, nesse caso, sem dúvida são o sexo frágil, escravos de uma
libido que só é satisfeita quando gastam dinheiro. Claro que muita gente
consideraria isso uma flexibilização da verdadeira força feminina, mas “As
Golpistas” não tem tempo para esse tipo de argumento. O filme parece dizer que
“tudo que é bonito é para se mostrar”, enaltecendo vários tipos diferentes de
corpo, mas limitando o quanto os espectadores cobiçosos podem realmente
admirar.
O
fato de Destiny ser iniciante serve como desculpa para os movimentos
desajeitados de Constance Wu (e, de qualquer forma, o foco de sua interpretação
está em ser o núcleo em conflito moral da história) e dá a Scafaria um motivo
para ir explicando a profissão aos espectadores. A menos que você já tenha
feito ou recebido uma lap dance, nem
todas as regras são óbvias – e, sinceramente, continuam sendo um tanto
misteriosas, mesmo com a explicação imparcial do filme. Na boate Moves (uma
mistura das boates Scores, Flash Dancers e Larry Flynt’sHustler Club), as
meninas não são pagas para dançar e trabalham ganhando gorjetas, tendo que dar
uma parte considerável (de 40% a 50%) para a boate, que fornece os aposentos
onde os clientes começam a abrir de verdade a carteira.
Em
“As Golpistas”, são as mulheres que objetificam os homens, reduzindo os
clientes a uma variedade de estereótipos superficiais (só Usher, que interpreta
uma versão ostentadora de si próprio, escapa ileso). A maioria é como Frank
Whaley, um cliente ricaço presunçoso e bajulador que entra na boate pela porta
dos fundos, como Ray Liotta no Copacabana em “Os Bons Companheiros”. Essa
tomada capturada com Steadicam também
serviu como inspiração para a cena de abertura em luz fluorescente que
acompanha Destiny do camarim até o palco.
Alguns
desses caras rasos de Wall Street – banqueiros e corretores que ganham milhões
de várias maneiras desonestas – não pensam duas vezes antes de gastar um valor
na casa dos seis dígitos numa única visita a Moves. “Eles podem te diminuir,
ser possessivos, agressivos e violentos”, conta Destiny para sua entrevistadora,
e cabe à nossa imaginação interpretar isso (a minha não parece ser muito boa,
já que a filosofia “vale tudo” da personagem pareceser contraditória à cena em
que ela chora após ultrapassar seu limite com um cara babaca).
É
mais seguro para as mulheres trabalharem juntas – como Destiny começa a fazer
com Ramona-, e isso também as ajuda a tirar mais dinheiro de seus caixas
eletrônicos humanos. “São negócios, o mais honesto que eles fizeram durante o
dia todo”, explica Ramona, comprando bolsas da Gucci com um maço de notas de um
dólar ensopadas de suor enquanto uma vendedora certinha observa com olhar
desaprovador.
E
é quando a economia despenca e os clientes começam a ficar mesquinhos. Da noite
para o dia, os homens passam a ser mais espertos com seu dinheiro – e uma nova
leva de lindas imigrantes está disposta a fazer sexo oral por 300 dólares. O
filme quase se rende ao slut-shaming,
tentando diferenciar striptease de
prostituição enquanto apresenta uma mudança nos negócios, no qual as mulheres
vão acabar levando os homens a casas chiques e hotéis para roubar seus cartões
de crédito. Durante a crise, Destiny acaba tendo uma filha, e apesar de Ramona
insistir que “a maternidade é uma doença” – culpando a mãe pela vida que leva
-, ela também tem uma filha, e as amigas precisam ser criativas para sustentar
suas famílias.
Ramona
chama isso de “pescar”: como os ricaços não estão mais indo até a boate, são as
dançarinas que têm que ir até eles e seduzi-los. Quando conseguem atrair um
desavisado (que acha que é seu dia de sorte), elas o levam até a Moves, onde já
fizeram um acordo com a boate para dividir o lucro da conta exorbitante. Isso funciona
por um tempo, até Ramona decidir que seria mais fácil se elas começassem a
adulterar a bebida dos homens com uma receita caseira, uma mistura de MD e
cetamina que os deixa apagados.
“As
Golpistas” não tem apenas uma, mas duas cenas em que Jennifer Lopez apresenta o
plano para suas “irmãs”, sem contar a cena em que Constance Wu o descreve com
indignação fingida para a jornalista interpretada por Julia Stiles – e nenhuma
delas parece especialmente plausível, muito menos necessária. Os espectadores
não precisam acreditar que elas achavam que seria seguro ou que usar entorpecentes
era “normal”, mas teria sido bom entender melhor o esquema, que envolve algo
como ligar para os clientes regulares e oferecer a eles muita diversão enquanto
estouram o limite do cartão de crédito deles.
Na
vida real, Foxx e Keo foram longe demais, mas se divertiram horrores enquanto o
esquema durou, e suas vítimas eram homens que, por terem dinheiro e status,
achavam que a grana era uma boa desculpa para a forma como tratavam as strippers. Claro que isso é simplificar
demais as coisas, só que normalmente as predadoras não são as mulheres.
Pouquíssimos filmes retratam o efeito e a proporção do mercado do sexo nos EUA,
e “As Golpistas” pelo menos mostra a adrenalina de um caso em que foram as
mulheres a explorar os homens. É só lembrar da cena em “Psicopata Americano” em
que o serial killer Patrick Bateman
mata mulheres com uma serra elétrica e pronto! Esse filme passa a ser uma
vingança das boas.
É com essa atitude que Scafaria conduz o longa e celebra de maneira perspicaz o excesso materialista. Filmado e editado como um clipe musical, cheio de movimentos de câmera para chamar a atenção e montagens gratuitamente longas, “As Golpistas” é uma subversão radical da percepção da profissão no século passado. Marisa Tomei pode ter aproveitado ao máximo seu papel em “O Lutador”, mas Shirley MacLaine, ao defender suas escolhas de carreira, disse que chegou um momento em que se cansou de interpretar prostitutas, capachos e vítimas – que eram os melhores papéis disponíveis para ela na época. E todas aquelas jovens buscando uma carreira que foram relegadas a fazer pole dance, seminuas e anônimas, em uma série como “Os Sopranos”? Bom, agora elas têm seu próprio “Os Bons Companheiros”.
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Gostou da nossa tradução? Saiba mais sobre todos os nossos serviços!
Ah! Você pode ler a publicação original em inglês aqui 😉
Hoje estamos aqui de verde, amarelo e bandeira arco-íris para comentar duas produções nacionais que estreiam nas telonas com uma mãozinha (ou patinha?) do ratinho.
Em tempos sombrios para o audiovisual brasileiro, é um prazer imenso constatar que estamos com gás total em produções incrivelmente relevantes, avançando nossa indústria. E melhor ainda é poder fazer parte do processo!
Bora conhecer essa dupla?
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MORTO NÃO FALA
O primeiro longa de Dennison Carvalho já foi exibido em cerca de 40 festivais pelo mundo com o título internacional de “The Nightshifter”, chegando ao Brasil hoje. Com aprovação média de 92% no Rotten Tomatoes e considerado pela revista New York como um dos melhores filmes de terror de 2019 (ao lado de “Nós”, de Jordan Peele), a produção traz promessa e expectativa em relação à aceitação do público brasileiro.
A obra conta a história de um médico-legista que trabalha durante a noite no IML paulistano e tem dons mediúnicos de conversar com os recém-mortos que passam por seus cuidados. O projeto começou como um seriado da Globo, mas acabou se tornando um longa no meio do caminho – o que se provou uma ótima decisão estratégica, visto que o filme já levou 5 prêmios pelo mundo. Dentre eles, um merecido prêmio de efeitos especiais, pela caracterização dos personagens feitos em esculturas idênticas aos atores para retratar os corpos sem vida, com seus rostos sendo animados digitalmente.
A acessibilidade do filme foi feita toda by LBM em parceria com a Casa de Cinema de Porto Alegre, com bastante atenção ao uso das músicas e efeitos sonoros trazidos pelas cenas. Tratando-se de um filme de terror, a trilha assume um papel de destaque na narrativa, expressando emoções chave. Em todos os seguimentos da acessibilidade, foi um desafio escolher como indicar esses sons variados para manter o suspense das cenas. É importante descrever com cuidado, acompanhando os sinais gradativos dados pela narrativa!
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GRETA
Tratando com naturalidade de temas bastante densos, “Greta” chega hoje aos cinemas com direção de Armando Praça. Sua trajetória, no entanto, já inclui o troféu Mucuripe por melhor longa-metragem, melhor direção e melhor ator para Marco Nanini, sendo o grande vencedor do Cine Ceará.
O roteiro de “Greta” passou por laboratório para chegar à sua forma final. Fernanda Leme, nossa colaboradora, formada em Cinema e especialista em roteiros, conta mais sobre: “O Laboratório Novas Histórias é um projeto idealizado e organizado por Carla Esmeralda, e faz parte do Programa Sesc e Senac São Paulo de Desenvolvimento de Roteiros para o aperfeiçoamento do ofício do roteirista no Brasil. É de extrema importância a iniciativa desses laboratórios, pois dá a oportunidade de novos roteiristas entrarem em contato com aqueles que já estão no mercado de trabalho, discutir e evoluir ainda mais os roteiros inscritos, para que um dia se tornem filmes. Do Laboratório Novas Histórias saíram grandes filmes, como: “Que Horas Ela Volta?”, “As Duas Irenes”, “As Boas Maneiras”, “Boa Sorte”, entre outros. Por muito tempo no Brasil, o roteiro era o ponto fraco do Cinema, mas dessas diversas iniciativas, e com o aumento de cursos, especializações e bibliografias e a valorização de sua importância, atualmente esse ramo tem se aperfeiçoado. Afinal, não podemos negar que o roteiro é a alma do filme! ‘Greta’ participou do laboratório em 2012. É um filme íntimo e singelo, mas que usa do escrachado dos bares populares ao cuidado dos hospitais para narrar sua história específica de amor. “
Aqui na LBM, pudemos legendar com carinho a tradução para o inglês enviada por nosso parceiro, a Carnaval Filmes, para que o filme brilhe mundão afora. Boa sorte, Greta!
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Este post foi escrito com a ajuda do nosso estagiário, Douglas Guizani! #ValorizeoEstagiário
Hoje, em celebração ao Dia Nacional dos Surdos, trazemos uma programação toda especial! Pela primeira vez na história do blog, publicamos uma tradução livre de um artigo que adoramos, feita com o carinho costumeiro pela nossa tradutora Paula Barreto.
Trata-se de uma matéria do site The Guardian sobre como o uso das legendas descritivas, ou closed captions, vem aumentando e ajudando até mesmo pessoas não surdas a compreender melhor os conteúdos audiovisuais. O texto mergulha a fundo no uso das legendas descritivas em vários cenários, inclusive a criação de memes.
Mas, acima de tudo, a matéria dá voz à comunidade surda na sua luta pela normalização das legendas, para que surdos e não surdos estejam em pé de igualdade, seja ao escolher uma série na Netflix ou entrar numa sala de cinema. E nós assinamos embaixo!
Além de ler esse textão incrível, passe nas nossas redes sociais para acompanhar o que preparamos para esse dia tão importante!
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Luzes, câmera, caption! Por que as legendas não servem mais apenas para deficientes auditivos.
Uma grande quantidade de pessoas sem problema de audição está dando preferência a assistir conteúdos legendados. Por quê? Será que as legendas deveriam se tornar o padrão?
“Legendas não são só para os surdos”, diz o tweet que foi o início de tudo. “Muitos amigos meus com audição perfeita também as usam. Se você não é surdo e ativa as legendas na Netflix e na TV e gostaria de vê-las no cinema também, dê um retweet para que elas se tornem a norma!”
O post recente de @deafgirly (Deafinitely Girly) acumulou rapidamente 75.000 likes e uma enxurrada de respostas. “Eu fiquei confusa inicialmente quando vi que o post tinha bombado”, disse a blogueira londrina de 30 anos, que prefere ser chamada pelo seu nome de usuário do Twitter. “Eu saí para almoçar com a minha mãe e não parou de chegar notificação no meu celular. Mas fiquei muito satisfeita com o apoio global de gente de todas as idades às legendas. Até as pessoas que não gostam de legendas no cinema disseram que as aturariam para que os surdos pudessem ir a mais exibições de filmes.” Uma mulher até contou para DG que ativa as legendas quando está muito chapada para ver suas séries favoritas.
Como o tweet e suas muitas respostas deixaram claro, não são apenas os surdos que contam com as legendas em 2019. O que já foi uma questão de acessibilidade e um alicerce das exibições em línguas estrangeiras está se tornando uma parte inevitável dos conteúdos audiovisuais. Em um artigo para o site americano The Outline publicado no início do ano, o jornalista Sean Neumann afirmou que a legenda salvou sua relação com “Game of Thrones” ao permitir que ele lesse e processasse grandes quantidades de informação a cada episódio (“Espera, quem é Lord Mormont mesmo? É a mesma pessoa que Ser Mormont?”).
Em outras mídias, memes de TV com falas legendadas viraram padrão nas redes sociais. Contas de Twitter No Context (Sem Contexto), que separam falas do roteiro de uma série do seu significado original, estão crescendo.
Muitas das respostas que DG recebeu eram de adolescentes e jovens na casa dos vinte e poucos anos dizendo que gostam de legendas porque assim podem fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo. Além disso, considerando que as séries de TV muitas vezes estão cheias de sons ambientes ininteligíveis (sendo a mais recente delas “The Virtues”, de Shane Meadows), não é de se espantar que as legendas estejam por toda parte.
Um estudo surpreendente de 2006 do Ofcom (o órgão regulador da mídia britânica) estimou que apenas 1,5 milhão dos 7,5 milhões de telespectadores britânicos adeptos das legendas têm deficiência auditiva. A estatística pode ser de 13 anos atrás, mas o órgão regulador diz: “Nossa percepção é de que o uso de legendas vem aumentando conforme o aumento do uso de aparelhos móveis e smart, já que cada vez mais pessoas estão assistindo a programas e vídeos enquanto se locomovem.”
Christina McDermott, que trabalha com redes sociais, explica essa mudança mais detalhadamente. “Não tem nada pior do que você estar sentada quietinha em um lugar e um conteúdo que viralizou e sua mãe botou no Facebook começar a tocar bem alto”, diz ela, acrescentando que as legendas podem fisgar pessoas desinteressadas. “Da perspectiva da indústria, estamos sempre procurando vídeos curtos que façam as pessoas parar de rolar a tela e parar o que estão fazendo para assistir até o final.” Ela diz ainda que até 85% dos vídeos do Facebook são assistidos sem áudio – portanto, com legendas.
Esse conceito de atrair a atenção dos espectadores usando texto em vez de elementos visuais levou a jornalista do “New York Times” Amanda Hess a apontar que “videomakers bombados na internet estão reutilizando as mesmas técnicas adotadas no cinema mudo de 100 anos atrás”.
Cada vez mais as pessoas assistem TV por influência das redes sociais, e a TV, por sua vez, as leva de volta a essas mesmas redes. O reality show “Love Island”, por exemplo, gera uma nova quantidade de influencers do Instagram a cada temporada. Enraizado nesse ciclo está uma cultura de memes que significa que quem é rápido o suficiente para postar a imagem de uma cena já com legenda pode se deparar com likes e retweets na casa dos cinco dígitos. E, claro, há as contas No Context, nas quais até os criadores de conteúdo estão se aventurando. O Twitter oficial da série “Sex Education”, da Netflix, é chamada “no context sex education” e posta apenas imagens do programa.
Mollie Goodfellow, escritora e criativa focada em redes sociais, acredita que ativar as legendas é “bem mais fácil do que criar as próprias legendas mentalmente”. Mas essa não é a única razão para ela assistir conteúdos com auxílio de texto. “Eu uso legendas desde que sou adolescente”, diz. “Não tenho nada diagnosticado (como TDAH), mas se tem muita coisa acontecendo no lugar em que estou, ou então se estou assistindo a um filme de ação barulhento, é mais fácil para mim ativar as legendas.”
Intrigantemente, parece que as legendas atraem principalmente crianças. Henry Warren é o cofundador da Tots, ou Turn on the Subtitles (Ativem as Legendas), uma campanha nova que solicita aos criadores de conteúdo que adicionem legendas nos programas voltados para crianças em idade escolar. Inspirado pela pesquisa feita pelo acadêmico indiano Brij Kothari, Warren e seu parceiro de negócios Oli Barrett decidiram ver se as redes de televisão prestariam atenção em dados que conectam o uso de legendas a um grande aumento no nível de alfabetização.
“A estatística (em estudos já existentes) parecia boa demais para ser verdade”, Warren me conta entre reuniões com grandes emissoras britânicas. “Então tentamos entender melhor e encontramos vários experimentos de rastreamento ocular diferentes que confirmavam os dados. Quando as crianças conseguem decodificar cinco palavras ou mais, elas realmente começam a acompanhar a leitura.”
Warren pensa no papel do Tots como uma conexão entre instituições acadêmicas, como a National Literacy Trust, e as grandes emissoras, a princípio com o objetivo de fazer com que as legendas se tornem um padrão em programas voltados para crianças de 6 a 10 anos. “Acho que vai chegar uma hora que nem vamos mais pensar nisso”, ele diz. “As legendas simplesmente estarão lá.”
Mas o que os surdos acham disso? Anna Gryszkiewicz, que tem 39 anos e mora em Östergötland, na Suécia, foi diagnosticada com perda auditiva neurossensorial aos 20 anos e começou a usar legendas. Ela vê o aumento do uso de legendas como uma evolução positiva. “Tem sido muito mais fácil achar ou solicitar legendas hoje em dia do que 15 anos atrás.” E acrescenta: “Os surdos vivem melhor atualmente.”
O avanço da tecnologia traz consigo preocupações sobre a qualidade das legendas. O YouTube muitas vezes usa legendas truncadas, feitas por máquinas. “Minha maior preocupação é confiar demais em tecnologias como as legendas automáticas”, diz Gryszkiewicz. “Sou engenheira e adoro tecnologia, mas não podemos nos esquecer dos aspectos sociais da perda de audição. Linguagem, comunicação e interações sociais são coisas complexas. As consequências da perda de audição ou da surdez não são o que as pessoas imaginam, e o impacto que isso tem na comunicação é muitas vezes subestimado.”
“Eu entendo que legendas de qualidade e outras ferramentas de acessibilidade são caras, e é justo usar tecnologia para reduzir custos, mas espero que levem a sério nossas opiniões quando tentamos explicar qual tipo de acessibilidade é útil e qual não é.”
Essa questão de alguns programas terem legenda e outros não, assim como o formato dessas legendas, é refinada por Jess Reid, da instituição beneficente Action on Hearing Loss. “O Ofcom afirma que um terço dos serviços on-demand não possui nenhum tipo de legenda”, ela diz. “Na última semana, recebemos reclamações devido ao fato do ‘Britain’s Got Talent’ ter legenda quando exibido na TV, mas não no serviço on-demand. E isso é apenas um exemplo. Recebemos frequentemente reclamações sobre programas de TV populares, de ‘Game of Thrones’ a ‘Love Island’, porque pessoas surdas e com perda de audição ainda não estão sendo levadas em conta.”
No entanto, os criadores de conteúdo têm suas objeções. Elliott Arndt, diretor de clipes musicais e curtas, tem oposições estéticas em relação às legendas. “Eu gosto de usá-las como elemento gráfico de uma produção, além da habitual ferramenta de informação”, diz ele. “Mas não é sempre que faço isso. Às vezes eu preferiria não ter que inserir legendas para manter a imagem limpa, mas a mensagem que estou tentando passar requer a presença delas. Nesse caso, tento torná-las parte do vídeo de uma maneira interessante, como, por exemplo, uma imagem que aparece para destacar certas palavras em momentos diferentes. Eu acho que para muita gente é difícil se sentir imerso na imagem se a pessoa tem que ficar lendo algo que ‘está na imagem’.”
Porém, como muitos outros, Arndt concorda que a popularização das legendas tem mais vantagens do que desvantagens, já que torna conteúdos audiovisuais mais acessíveis, compreensíveis e dinâmicos. “Tornar as legendas obrigatórias pode ser uma maneira interessante de incentivar as pessoas a criar um sistema novo”, ele diz. “Algo que não estrague a experiência visual, mas que seja adequado às necessidades de todos.”
Deafinitely Girly está totalmente otimista com as possibilidades. “Quanto mais pessoas usarem legendas, melhor”, diz ela. “Seria ótimo se fossem obrigatórias para todos os serviços de streaming e para pelo menos 50% das sessões de cinema.” Essa mudança permitiria que ela fosse ao cinema nos finais de semana assistir a lançamentos com o marido, que não tem nenhum grau de surdez. Além disso, isso significaria ter um padrão inclusivo, e não exclusivo.
“Minha surdez me deixa muito isolada às vezes”, diz DG. “Eu perco as piadas dos vídeos nas redes sociais, conteúdos viralizados não significam nada para mim e não posso acompanhar as notícias recentes de que todos estão falando no Twitter. Se as legendas fossem universais, isso mudaria completamente.”
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Os memes foram retirados da matéria original e traduzidos/explicados na legenda. Acesse o original aqui.